Às 3h da manhã, as palavras dormem enroladas em cobertores de silêncio. A noite despeja suas ausências pelo quarto e eu sinto as paredes respirarem devagar, como se temessem acordar os sonhos presos no teto. Os sonhos novos e velhos, fogem como vaga-lumes assustados, e eu os caço com redes feitas de pensamentos solitários.
É uma hora em que os sentimentos viram andorinhas cegas, esbarrando nas paredes da noite. Sinto-me como uma pedra que sonha em ser líquida, mas permanece inerte no meio de um deserto de palavras não ditas em busca de estrelas que já não piscam. A lua, cúmplice silenciosa, derrama luz de saudade sobre a escrivaninha, onde versos inacabados esperam a manhã para serem esquecidos, abandonados.
A madrugada é uma estrada sem fim, cada tic-tac do relógio é um passo na trilha da eternidade. Fico desenhando constelações com pontos de interrogações, poeta é uma ave noturna de asas cansadas vagando por um campo de sonhos desfeitos. Entre as sombras da noite, em seu abrigo profundo, busca a palavra que redesenhe o mundo. Espera por palavras novas na aurora enfim, na solidão das 3h, seu poema sem fim.
Eu, chave, sou trinco e tranca,
Sou o ser que veste o silêncio que nunca estanca.
Sou porta emperrada no escuro, sem prumo,
Que dança com o peito, em sentimento puro.
Nas mãos do tempo, sou ferrugem,
Um enigma entre chaves e portas de nuvens.
Desvendo dores, suportando a vida,
Estrada estreita entre horas tortas corridas.
Porta fraca, feita de véu,
Que só queria abrir o céu.