Ser polarizada é ter um vendaval que habita no peito, um deus de duas faces sussurrando opostos: ora sou Prometeu roubando o fogo, ora Ícaro despencando do céu. Entre esses extremos, a vida se desenrola como um mito pessoal, uma jornada onde o equilíbrio é miragem e o tempo é um trapaceiro que altera o ritmo do coração.
Tomás de Aquino falava da Temperança como a arte de conter os excessos, um freio para os impulsos. Mas e quando a própria existência é um movimento entre o tudo e o nada? A temperança, no mito e na filosofia, aparece como a justa medida, o fio de ouro que costura caos e ordem. No hermetismo, ensinam que tudo é ritmo e vibração, que a oscilação entre os extremos é inevitável, mas que pode ser conduzida. Como habitar os extremos sem ser engolido? No céu, Saturno e Júpiter travam essa dança há milênios – o rigor e a expansão em eterno embate.
E se esse embate não fosse apenas celeste, mas também cravado no seu peito? E se no seu espelho não morasse um eu, mas um bicho de vento, que ora assovia, ora despenca? E quando o seu cotidiano se torna um espelho refletindo ora um rei, ora um náufrago, e o mundo responde com espanto a cada mudança de vento? O mundo espanta, mas espanta quem?
Vivo à espera da carruagem dourada de Apolo, aquele que sem polos, pulsa entre os polos, para ao som de sua lira, me conduzir aos extremos da criação e da ausência enquanto me ensina a como incendiar sem me consumir. Aceite – ele diz – a oscilação como um compasso íntimo entre a fúria e a calmaria. Um pacto solitário com os deuses das marés: És vendaval, e és também quem dança com ele.