Queria escrever sobre o hoje, sobre o ontem

Sobre jornadas alienadas e minha alma obstinada

Sobre o pouco de tudo e o muito do nada

Que me cerca e me resta, que me faz resto

De mim, e de minha vontade sempre finada

Queria escrever, descrever, antes que minhas

Palavras, percam o direito de ação nos confins do nada

Mas Saturno condensa, não deixa, me deixa confinada

Em águas que nunca sobem e o fogo que nunca deita

Na cruz do mundo, a esperança é sempre refeita

Queria escrever, mas não tenho tempo, ele me tem

De refém. É o Tempo quem me dá e tira os sonhos

Resta-me engasgar o dia por palavras engolidas

E a semana me dói, é santa, símbolo para reflexão muda

De minha muda andança, sobre a mudança de vida

E o poder da conversão, da oração, da hora em ação

Horas são soldados do Tempo, passageiros de idas

E vindas, recordando-nos a transitória, efêmera fragilidade

Da humana vida sujeita à morte, às paixões, às sextas feiras

Em repetitivos inícios do Tríduo Pascal, pela imortalidade

Lavem-Pés em pôr dos sois de eternas quintas-feiras

Celebre! A Eucaristia (ou Comunhão), a oportunidade

Da humildade. Mas ninguém nunca presta atenção

Estão todos também engasgados, vazios de tão cheios

De palavras engolidas ou mal ditas

Todos levados no bolso do tempo em infinitas

Últimas Ceias, que sempre acabam em prisão, traição

Perdem-se o corpo no corpo, e o cálice da nova aliança em paixão

Queria escrever mais por aí, falar, mas Saturno condensa, não deixa,

Me diz cale-se, e é Semana Santa, aleluia pois há muito chão para a Ressurreição

A superstição por falta de escrita me engasga o dia da vida não descrita

Engulo palavras, corpo, aleluia, aliança, na esperança

De ressureição para fora desse pouco do tudo, desse muito de nada.